RONALDO MAGELLA - SOFREMOS DE HUMANIDADE
Concordo com Luiz Felipe Pondé quando ele diz que “o destino de nossa espécie pode não ser apenas função da devastação de florestas, mas também da devastação do afeto que fica invisível no cotidiano”, nós iremos desaparecer pela nossa falta de afeto, conseqüência do nosso orgulho e do nosso egoísmo e que provocará o nosso fim.
Não precisamos ir muito longe nem fazermos uma interpretação profunda da sentença de Pondé para concluirmos a veracidade da afirmação, só precisamos ter coragem para olhar o nosso dia a dia e pensarmos sobre ele e sobre a nossa prática diária de vida, a forma como estamos conduzindo a nossa existência, sob quais valores nos deixamos influenciar e quais valores nos mantém a atenção, sexo, poder, fama, dinheiro...em detrimento a simplicidade da vida, dos abraços, sorrisos, das conversas, dos momentos.
Alguém já disse que nós sofremos de humanidade, sofremos daquilo que a nossa condição humana produz, e não estou falando de tecnologia, riqueza, poluição, mas de sentimento, ou melhor, da pobreza dos nossos sentimentos. Morremos pelo tédio diário das nossas relações, da falta de carinho, de amor, de alegria, afeto, sinceridade, verdade, da falta de relações puras e inocentes, sim, ainda acredito em inocência, até gostaria de ser uma das crianças as quais Jesus menciona como herdeira do Reino dos Céus, da Terra ou até mesmo do futuro. Mas de criança e inocência não sofre, sofro e padeço de infantilidade, imaturidade e pobreza humana, da minha condição de humanidade.
Sofremos de desejo e interesse, o desejo que nos esmaga e nos sufoca, as paixões e vícios que nos predem, e pelo interesse mesquinho e vil que rege e conduz as nossas vidas, momentos, as nossas relações. Um pensador de si mesmo sofrerá ao desejar e perceber o que deseja, e o pior, que lugar contra o que se deseja é a pior e mais atroz batalha que se possa enfrentar, saber dizer não a si mesmo, não se deixar guiar pelos discursos falsos da sociedade que se insufla para depois lhe apedrejar.
e outro, mais, alguém que tenha o “conhece-te a ti mesmo”estampado na consciência e pregado diante dos olhos na frente do espelho viverá a solidão dos solitários e desapegados do mundo, da matérias e do egoísmo. É como viver no mundo sem ser do mundo, é viver estando morto, é morrer para viver, é viver para não morrer.
Nunca foi tão difícil e solitário viver sem querer, desejar e seguir pelos caminhos dos interesses mundanos e sofremos, poucos de nós, é bem verdade, da maldição de pensar por nós mesmos e procurarmos nosso próprio caminho para enfim poder dizer não a si mesmo e conseqüentemente ao mundo. Poucos de nós temos coragem de nos investigar, nos pensar, nos conhecer, é mais fácil viver como conforme a massa, o todo, do que nos assumirmos e nos diferenciarmos.
Não existe verdade sem dor, paz sem medo, amor sem guerra, vida sem morte, para que possamos viver o que queremos precisamos antes renunciar ao que desejos e vivermos o que não queremos, eis a nossa guerra, a nossa espada, antes de assim galgarmos a nossa paz eterna.
E poucos, bem poucos, de nós temos coragem de viver isso, daí o nosso mundo, a nossa violência, as nossas tragédias, as nossas mortes, os nossos escândalos, pois cada um de nós quer fechar os olhos e viver o seu próprio sonho de felicidade e egoísmo, viver sob seu manto de orgulho e individualismo, nos fechando e nos trancando em nossas próprias vidas. Estamos condenados não pela causas, mas pelos efeitos, ou seja, pela nossa humanidade, pelo que fazemos.
Não morremos nós pelo que somos, mas pelo que fazemos, os efeitos, não é a violência que irá nos matar ou a poluição, mas nós quem provocamos a violência e produzimos a poluição, estamos nos matando aos poucos, sucumbindo pelo nosso egoísmo, pois tudo que nos acontece é produto nosso, pela nossa omissão ou pelo nossa maldade e agora, mais do que nunca, pela nossa falta de afetos.
Ronaldo Magella
Jornalista e Professor - Blog - http://www.ronaldo.magella.zip.net/


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